Perfect Days, 2023.

Sempre quis uma vida simples. O que não necessariamente significa ter uma vida fácil. Mas às vezes, por um certo número de dias, talvez semanas e (se o universo sorrir) meses, as duas coisas se sobrepõem e eu tenho o privilégio de viver dias perfeitos que parecem sem fim, onde o simples e o fácil se entrelaçam e eu me vejo cantando Racionais na bicicleta ou cortando o cabelo do baixista de uma banda que admiro- ou tendo tempo o suficiente em uma sexta para assistir esse filme todo antes de ir dormir. Reconhecer o próprio privilégio é fundamental. Hirayama pratica a arte de notar, inspirar e deixar passar. Ele parece entender o privilégio do seu trabalho, rotina, cidade, casa e, finalmente, a vida inteira que leva. Tento fazer o mesmo. A solidão também é um privilégio, um benefício, um presente, como diz aquele poema. Há um custo, claro, pessoal e intransferível para cada um. Mas: que vida. Ele lá indo de bike por Tóquio pegar um livrinho, eu aqui de bike aqui em Rotterdam indo assistir um filme depois do trampo. A gente chora e sorri ao mesmo tempo, porque no final, é a mesma coisa. Ser testemunha da própria existência, e por consequência de todo mundo, é talvez a única coisa que realmente importa pra mim. Perfeição é o que tu quiseres que seja.