Depot Boijmans Van Beuningen, Rotterdam.

Meus dias de folga são escassos, caindo sempre no meio da semana. Algumas vantagens: os mercados estão mais vazios, cinemas virão sessão privada, bares meio abandonados. Não que eu tenha saído muito. Ainda mantenho a reclusão como primeira ordem. São tempos esquisitos. Todavia, entrando no ano três de uma pandemia global, comecei a aventurar mais e mais além dos meus limites autoimpostos. O Depot (apelido do depósito-museu que na pronúncia local vira “depóte”, numa brincadeira com parecer um pote e ser de fato um depósito) é um prédio esquisito, que parece uma enorme saladeira inox. Chama atenção, de longe e de perto. Por um tempo, morei perto dele e nunca me acostumei ao sair para correr e me ver refletido em sua superfície. Mas a cidade inteira é cheia de prédios e construções esquisitas. O que me interessava era o que estaria dentro dele: os arquivos do museu principal da cidade, o Boijmans Van Beuningen, uma expansiva coleção de uns oito bilhões de euros. Um depósito que te deixa dar uma olhada.
Infelizmente não dá pra se ter noção dessa coleção toda ao entrar no vertiginoso hall do Depot. A área central do prédio é recheada de displays de vidro, que separam as obras por material. Pode-se ver obras por diversos ângulos, flutuando em vidro. E após alguns minutos, é isso mesmo. Não que sejam obras ruins ou desinteressantes. Mas a sensação de que ao invés de ser uma experiência imersiva em um arquivo absurdo, tu só consegues ter uns relances aqui e ali do que seria a coleção em si. Fora as peças expostas na área central do prédio, não tem muito mais se ver. Tudo fica trancado em salas enormes, com uns janelões de vidro que te permitem olhar meio de lado o que tem lá dentro.

Caminhei por todos os corredores do prédio, em busca de mais. Num canto, um enorme Buda de pedra trancado em uma sala privada (os donos reais das obras do museu), mesas com dezenas de formas em pelúcia de Yayoi Kusama em cima de mesas e caixas de madeira. Uma enorme pintura barroca em outra sala, sendo restaurada por alguém. Momentos interessantes, que me deixaram querendo mais. Mas não tinha nada mais, não naquele dia. Nos últimos andares, o prédio começa a ficar cada vez mais vazio, apesar da sensação de que logo ali tem uma infinidade de coisas a serem observadas. Acho que na real eu só tenho essa fascinação por making-offs e pensei que estaria para entrar nos bastidores de um museu gigantesco. Essa visita foi uma lição em gerenciamento de expectativas. Nada de halls e halls de obras que consumiriam o meu dia inteiro. Mas sim uma coleção de janelas que te dão umas frestas. Aproveita, é melhor do que fresta nenhuma. Um sentimento familiar de gratidão (não-irônica), que me acompanha há anos morando nessa parte velha do mundo, apresenta-se. Agradece e aproveita o que te foi dado, meu velho.